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Saúde e bem estar

Dependência virtual: como identificar e tratar o vício

03.03.2021
Redação Chata de Galocha

Você sentiu que, durante a pandemia, o seu tempo em frente ao computador e, principalmente, ao celular, aumentou muito? Se sua resposta for “sim”, pode ter certeza que não está sozinho nessa. Mas, a verdade é que não é de hoje que gastamos grande parte do nosso dia rolando feeds, respondendo mensagens e assistindo vídeos, né?

E, por isso mesmo, não é de se surpreender que esse hábito cada vez mais presente na nossa rotina tenha se tornado um verdadeiro vício para muitas pessoas. Pois é… A dependência virtual é uma doença que precisa ser identificada e tratada

Foi justamente para promover discussões e reflexões sobre os fatores que envolvem a Dependência Virtual, a psicóloga Carla Egídio Lemos publicou um livro-caixinha chamado Dependência Virtual – 100 perguntas sobre como lidar com a conectividade de forma saudável. 

Conversamos com a profissional para entender melhor sobre esse tipo de vício e como tratar o problema.

Quando o uso de internet passa a ser considerado um vício e quais as consequências disso?

O que aponta o vício da internet é a dificuldade em resistir a ela e se controlar quando já estamos conectados.

As consequências, infelizmente, são muito graves. Algumas delas se refletem fisicamente, como prejuízo na postura corporal, olhos secos e problemas de vista e audição, dores no corpo. Quadros de insônia se iniciam ou são agravados, devido à luz da tela e ao alto estímulo cerebral. E existem também as neurológicas, psicológicas e emocionais, como por exemplo: um agravamento nos quadros de Depressão e Transtornos de Ansiedade, prejuízo na auto estima, dificuldade em se concentrar, aceleração dos pensamentos, prejuízo na memória e em se aprofundar em conhecimentos e informações, aumento da irritabilidade, dificuldade em se sociabilizar.

Para os adolescentes e crianças o impacto ainda é mais profundo, pois a área do cérebro mais afetada, de acordo com os estudos até o momento, é o córtex pré-frontal. Essa área termina de amadurecer por volta dos 21 anos de idade. Ela é a base da cognição, do comportamento, e das respostas emocionais. Então, temos consequências envolvidas nessa área, como maiores índices de comportamentos de risco, dificuldade em raciocinar logicamente de forma clara e profunda, controle e inteligência emocional, dentre outras.

Um estudo recente mostrou que o vício em internet pode ser comparado a um vício químico. Por quê?

Todo vício existe, pois aciona um funcionamento cerebral que resulta na dependência. Esse mecanismo acontece assim: fazemos algo que nos dá uma recompensa prazerosa e repetimos esse comportamento com frequência. Quanto maior o prazer atingido, maior a probabilidade de criar dependência, assim como se estamos tendo esse comportamento para administrar um desconforto muito grande. Então se tem alguma coisa que me incomoda muito e, por isso, eu uso a conexão para fugir dela, eu tenho uma falsa sensação de que o problema está resolvido.

É inegável que encontramos diversos tipos de prazeres ao nos conectarmos, sejam prazeres sociais, psicológicos, emocionais… Quando fazemos algo que gera essa sensação de prazer e bem estar, é muito fácil para o cérebro nos direcionar para aquilo novamente, como uma solução para a felicidade ou para escapar do desconforto.

É também importante pensar que a conexão virtual funciona de uma forma muito intensa. Não existem outros contextos em que façamos tantas coisas ao mesmo tempo, em que tenhamos tantas informações tão rápidas, e tão superficiais. As redes sociais estimulam uma falsa sensação de ser bem, ou mal, quisto pelas outras pessoas, de forma muito poderosa.

Quais os sinais da dependência?

Existem indícios que apontam para a dependência já instalada, como: passar mais tempo conectado do que gostaria, ter prejuízos nas relações pessoais, ter o trabalho prejudicado, abdicar de tarefas importantes para manter a conexão, alteração de humor caso a conexão não aconteça, pensar com frequência no que está acontecendo nos ambientes virtuais, se esforçar para ficar menos tempo conectado e ter dificuldades para isso, perder a noção do tempo durante a conexão, precisar aumentar o tempo conectado para se sentir tão bem quanto antes.

De que forma é feito o tratamento nesses casos?

Apesar da Dependência de Internet ser um quadro muito novo e ainda ter se muito a descobrir, hoje já existem lugares específicos para o tratamento, como no Hospital das Clínicas de São Paulo. A Psicoterapia Cognitiva Comportamental também é um instrumento muito poderoso no tratamento, dentro da psicologia.

O primeiro passo é a pessoa entender que ela precisa de ajuda e que seu quadro tem graves consequências, por isso criamos o livro, pois as perguntas conduzem a essa compreensão.

Depois, o profissional precisa perceber qual é a dimensão da situação e desde quando acontece. Em seguida, vamos entendendo a forma de se conectar da pessoa e quais são os seus contextos de vida.

Dependendo dos fatores que motivam esse excesso de conexão, vamos procurando estratégias psicológicas para lidar com eles, e usamos técnicas cognitivas e de comportamentos para administrar os pontos em que esse excesso aparece.

Algumas mudanças no estilo de vida podem ser muito importantes. Em alguns casos são indicados o acompanhamento psiquiátrico também.

Quais hábitos deveriam ser adotados no dia a dia para evitar que se chegue ao ponto da dependência?

É muito importante entender que a internet não é má e ruim, mas precisamos lidar com ela de uma forma saudável e equilibrada.

Tratar questões emocionais e psicológicas é uma das formas de evitar que esses gatilhos sejam usados como fuga. Ter uma rotina equilibrada também é fundamental. Buscar diferentes formas de prazer e conexões sociais, em ambientes presenciais e físicos. Determinar um período do dia, ou um certo tempo limitado para ficar conectado. Ter momentos ou dias para ficar sem se conectar – um final de semana, por exemplo, ou usar a internet somente quando necessário.

Ter auto percepção ao se conectar, e fazer isso de forma intencional e consciente.

Quando a pessoa trabalha com internet e precisa ficar online durante todo o dia, como fazer essa separação?

O equilíbrio novamente é essencial nessa situação. Se eu passo todos os dias da semana conectada, pois é o meu trabalho, aos finais de semana eu preciso me desconectar. Posso ler, caminhar, ir a um parque, dormir, descansar, assistir uma série, mas evitar ao máximo a conexão virtual.

Além de alimentar a rotina do dia de trabalho com momentos em que eu faça pequenas pausas para desligar minha mente da internet. Como por exemplo, ter 5 minutos, frequentes durante o dia para tomar um café, fazer um alongamento, meditar, para poder relaxar a mente e diminuir o ritmo de funcionamento e dependência que a conexão nos traz.

Sobre o seu livro, como os cards devem ser usados no dia a dia? Pode citar o que tem escrito em alguns deles?

A ideia é ler as perguntas e pensar sobre o que, na sua vivência e história, pode desencadear e fortalecer essa dependência. Você pode tirar um ou dois cards por dia para isso.

Mas o livro não é voltado somente para a reflexão pessoal. Ele também pode ser usado para discutir em grupo, em família, durante a sessão de psicoterapia ou como uma tarefa de casa, servir de base para anotações e monitoramento de como a dependência tem evoluído ou regredido, e assim por diante.

É difícil escolher as perguntas favoritas, dentre tantas, mas eu acredito que essas são alguns exemplos interessantes:

  • O que faz você passar seu tempo conectado às redes sociais?
  • Se o seu celular fosse uma pessoa, o que diria a ele em relação a como você se sente com esse relacionamento?
  • Quais são as tarefas importantes na sua vida que você acaba colocando de lado para ficar nas redes sociais? Como isso foi acontecendo?

Esses três exemplos podem revelar motivações e consequências profundas. Se você pensar bem, muitas vezes nos conectamos para fugir de questões que nos incomodam, para buscar prazer, para reafirmar nossa autoestima e por aí vai. Além das consequências como prejuízo no trabalho ou nas relações pessoais, dentre outras. Então, se pensar profundamente sobre a pergunta pode descobrir pontos muito importantes que talvez não notasse sem esse questionamento, pois é muito comum fazermos tudo automaticamente, sem a reflexão das nossas atividades e seus efeitos.

Também é importante lembrar, nesse caso, que cada pessoa vai ter suas próprias motivações e consequências, por isso não dá para generalizar, e as respostas acabam sendo muito pessoais. Por isso, a troca com outras pessoas acaba sendo interessante.

Você encontra o livro Dependência Virtual aqui.

A Lu contou em um vídeo recente no canal que se propôs a deixar o celular de lado, após às 20h30. Que tal se inspirar neste desafio e tentar também? Aqui, ela conta mais sobre essa meta! <3

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